Saturday, January 12, 2013

Gamification e Comportamento

Uma tradução e adaptação do post publicado em Gamifeye em novembro de 2012. O post discute a forma como a gamification deve ser usada para ser um motor de mudança do comportamento humano, promovendo comportamentos desejados e inibindo comportamentos desejados. Para tal, é necessário atuar na motivação intrínseca e não apenas na motivação extrínseca.

Entre as muitas definições de gamification, uma das mais citadas é aquela que é proposta por Sebastian Deterding: "O uso de elementos de design característicos dos jogos em contextos não lúdicos". Quando os elementos de design de jogos são adicionados a um qualquer contexto não lúdico, a expectativa é que se gere, entre os envolvidos nesse contexto, um nível de envolvimento semelhante ao que é conseguido com os jogos.

Mas as coisas não podem ficar por aqui. Qual é o objetivo de alcançar este tipo de envolvimento? Deixando de lado a discussão sobre o que é um ambiente semelhante aos ambientes encontrados nos jogos e por que é que isso é considerado positivo, o que um projetista de um sistema que aplique gamification realmente quer é promover certos comportamentos desejados – ou reduzir aqueles que são indesejados - entre os jogadores que são o público-alvo desse sistema.

Esta ideia pode ser expressa como uma fórmula: 

Elementos de design de jogos + Contextos não lúdicos = Nível de envolvimento idêntico ao dos  
                                                                                                 jogos

Desta forma, certos comportamentos desejados podem ser estimulados.

Ver o conceito de gamification como o que está expresso na primeira parte desta fórmula (o lado esquerdo da igualdade) é redutor. Na verdade, a criação de um ambiente de jogo bem sucedido não pode estar limitada a premiar os jogadores com pontos e troféus e atribuir insígnias.

O poder do conceito de gamification está de facto na sua capacidade de influenciar o comportamento. A grande preocupação dos projetistas de sistemas que apliquem o conceito deve ser a definição de comportamentos-alvo, de metas para esses comportamentos e de formas de medição e de análise das mudanças verificadas nesses comportamentos-alvo.

A maioria das aplicações que usam gamification, assenta no fornecimento de alguma forma de recompensa pelas atividades realizadas pelo jogador. Estes sistemas utilizam as mecânicas de jogos mais comuns, tais como insígnias, níveis, quadros de liderança, metas e pontos. Isto é o que Scott Nicholson chama “BLAP gamification” (Badges, Leaderboards, Achievements and Points), na mesma linha  do que Kevin Werbach designa por “tríade PBL” (Points, Badges and  Leaderboards). Outros ainda chamam a esta visão restritiva "pointsification", devido à tendência de supor que a simples inclusão de um sistema de pontos equivale a criar uma experiência envolvente para o utilizador, semelhante à de um jogo.

Esses tipos de elementos adicionados a contextos não lúdicos certamente que vão no sentido de criar um ambiente semelhante ao ambiente dos jogos. Contribuem também para impulsionar a mudança de comportamento entre os jogadores. Tais mecanismos são importantes para fornecer feedback, reforçando os comportamentos desejados e desencorajando aqueles que são indesejados. Mas estes elementos apenas atuam sobre a motivação extrínseca do utilizador. Este é apenas motivado para completar uma tarefa porque lhe é dada uma recompensa por isso. E se a recompensa é retirada, perde-se a motivação. De facto, as recompensas funcionam apenas como um fator de motivação para  tarefas desagradáveis ​​ou aborrecidas. Pior ainda, se uma recompensa é dada por completar uma tarefa que a pessoa já gosta de fazer, a sua vontade para concluir a tarefa diminui. Alfie Kohn apresentou vários exemplos interessantes de como os incentivos extrínsecos podem realmente reduzir a motivação.

No entanto, isto não significa que os designers de sistemas de gamification não devem usar elementos como os que integram a “tríade PBL” ou a “BLAP Gamification”. As recompensas extrínsecas devem ser usadas para tarefas e atividades para as quais os destinatários não estão intrinsecamente motivadas para realizar. Mas, como uma estratégia de longo prazo para melhorar o desempenho e influenciar comportamentos de influência, não são a melhor escolha.

Portanto, o conceito tem de abranger mais do que os elementos BLAP ou PBL. Um bom sistema de aplicação de gamification deve também atuar sobre a motivação intrínseca dos utilizadores. Se um utilizador executa uma tarefa pela própria tarefa, isso significa que está intrinsecamente motivado para realizar essa tarefa. E isto é o que acontece quando as pessoas jogam. A gamification, ao procurar criar um nível de envolvimento numa atividade não lúdica semelhante à dos jogos, deve criar uma experiência com significado e que não dependa apenas de recompensas extrínsecas. Scott Nicholson chama a essa abordagem "meaningful gamification" (gamification com significado).

Esta visão mais profunda do conceito é inspirada por várias teorias e trabalhos de de investigação: a Teoria da Auto-determinação e a noção de "Autonomia, Mestria e Sentido" de Daniel Pink, para citar apenas duas. Também vale a pena mencionar modelo de comportamento de Fogg, que proporciona uma visão sobre o que impulsiona o comportamento humano. No âmbito de aplicações concretas do conceito, Gabe Zichermann propôs uma estrutura de recompensas que lida com a forma como os jogadores valorizam essas recompensas que designa por "SAPS" (Status, Access, Power and Stuff).

Em resumo, para criar sistemas eficazes de aplicação de gamification, os projetistas desses sistemas não devem apenas pensar em mudar o comportamento atuando na motivação extrínseca. É também necessário criar uma experiência com significado para os utilizadores, criar afinidades entre eles, melhorar o seu status na comunidade e dar às suas ações um propósito.

E, finalmente, os projetistas nunca devem esquecer que toda experiência deve ser divertida!

(para referências, consultar a publicação em Gamifeye)

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